Transferência de mercadorias entre estabelecimento do mesmo contribuinte – não incidência
Por André Crossetti Dutra - Advogado Tributarista
O ICMS é um imposto cobrado pelos Estados e pelo Distrito Federal, que incide sobre as operações relativas à circulação de mercadorias e sobre a prestação de transporte interestadual e intermunicipal e sobre serviços de comunicação, conforme estabelecido no artigo 155, II da Constituição Federal.
Em nível nacional, o imposto é regulado pela Lei Complementar nº 87/1996, que estabelece, em seu artigo 12, como fato gerador do ICMS, a saída de mercadorias do estabelecimento do contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular, previsão que é repetida nas legislações estaduais e nos respectivos regulamentos do ICMS.
No entanto, a cobrança do ICMS nas hipóteses de saídas de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte é inconstitucional, conforme será explicado a seguir.
Com efeito, a Constituição Federal estabeleceu como hipótese de incidência do ICMS a circulação de “mercadorias”, razão pela qual devemos ter em mente o alcance semântico das expressões “operações”, “circulação” e “mercadorias”.
O conceito constitucional da expressão operação deve ser entendida como um negócio jurídico, com conteúdo econômico, que visa a transferência da titularidade do bem.
Daí porque também que a expressão circulação, que exprime a transferência de bens entre sujeitos de direito, passível de ser alcançada pela norma tributária, diz respeito somente àquela circulação que envolva mercadoria.
Em resumo, a hipótese de incidência do ICMS somente ocorre quando o contribuinte realizar operações que impliquem na circulação física e jurídica do bem, com a transmissão de titularidade dos bens destinados ao comércio, que daí sim, poderão ser chamadas de mercadorias.
A legislação do ICMS estabeleceu, portanto, uma hipótese de incidência não prevista na Constituição Federal, uma vez que faz incidir o imposto em operações que não configuram a circulação jurídica do bem, ou seja, onde não ocorre a necessária transferência de titularidade.
No caso de operações de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, a legislação infraconstitucional, equivocadamente, equipara estas transferências como se operação mercantil fosse, o que não é verdade, posto que para que sejam consideradas mercantis, é indispensável a existência de outra pessoa, física e jurídica, para qual será transferida a titularidade da mercadoria.
Importante referir que a jurisprudência de nossos tribunais tem o mesmo entendimento, mas como não houve a declaração de inconstitucionalidade do art. 12 da Lei Complementar 87/1996, os Estados continuam a cobrar o ICMS nas transferências de bens entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, onerando de modo indevido suas atividades.